segunda-feira, 28 de março de 2011

Cocô de gente, parte 1.

Há uns dez anos, quando mudei para a terra de Noel Rosa, esse belíssimo bairro de Vila Isabel, cheio de histórias e estórias, boemias e igrejas, tranquilidade e festas, samba de qualidade na minha janela, encontrei aqui algo que já não via mais em outros lugares: um andar na rua despreocupado, um chegar de madrugada sem medo. Morar numa esquina com bares e restaurantes em seus quatro cantos pode parecer ruim (e o é para alguns), mas era uma bênção. Apesar da proximidade com o Morro dos Macacos, o tal que derrubou um helicóptero, nada me tirava a tranquilidade de ir e vir sem precisar me preocupar com horário, graças ao bares e ao movimento constante.

As calçadas, onde constam partituras de músicas maravilhosas como Feitiço da Vila, de Noel e Vadico, eram sujas por cocô de cachorro e imediatamente limpas pelo dono do cachorro, que carregava um saquinho, educamente.

Mas de um tempo pra cá tem havido um declínio geral na educação do bairro... E tenho ouvido que se trata de um fenômeno que está atingindo muitos outros bairros. Cocôs foram surgindo por todo lado. Seria possível que os moradores estivessem deixando de catar os cocôs de seus cãezinhos de estimação, uma atitude peculiar e aprovada por todos??...

Infelizmente, foi muito fácil constatar que se tratava de cocô de gente. Dos mendigos que têm se multiplicado, triplicado, quadriplicado, nos últimos anos. O problema não é a quantidade de cocôs pela rua e o cheiro que isso deixa, principalmente em dias molhados. Nem a avalanche de abordagens por pedintes a cada dez passos. Vou a pé para o trabalho e é impressionante a quantidade de pedintes que me aborda num percurso de 10 a 15 minutos até chegar ao meu destino. O problema não é a agressividade que muitos desses pedintes adotam. Nem a tensão gerada nessas relações.

O problema é nosso emocional que fica esculhambado! Um misto de ódio e pena, de culpa por não fazer nada para mudar essa situação e a falta de culpa por não incentivar essa indústria...
Sou um cidadão que classificaria como precário. Pago meus altos impostos, meu aluguel (ainda não tive como comprar um imóvel), dou duro para conseguir pagar minhas contas e, isso fiz de caso pensado, moro perto do trabalho para não ter gastos com transporte, além do estresse em longas viagens de ônibus lotado com considerável perda de qualidade de vida.

Enquanto isso, pessoas que poderiam de fato ajudar a mudar essa situação estão se blindando em carros e se isolando em casas com cercas eletrizadas, ou edifícios-forte, com seguranças, filmadoras, grades e, claro, porteiros para encararem o front. Tanta precaução porque não estamos na Idade Média, ou Antiga, senão construiriam muralhas e fossos.

O fato é que não sei o que fazer para mudar isso. Gostaria de encontrar uma fórmula que me permitisse resolver, ou salvar, ao menos os mendigos de minha vizinhança...

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