domingo, 4 de dezembro de 2016

Para um bom entendedor...

Não gosto de textos/falas que desqualifiquem pessoas, ou coisas. Os textos, ao serem ditos, permitem a construção de uma imagem de quem está dizendo e não gosto de textos arrogantes, porque são portadores da arrogância de quem os diz.

Uma vez um professor de literatura disse que Mia Couto (escritor moçambicano) não chega a ser um Guimarães Rosa... "não chega a ser" significando que a obra de Mia Couto era inferior à de Guimarães Rosa. Mas como comparar esses dois autores? De épocas tão diferentes, países tão diferentes? Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Fernando Pessoa, James Joyce tiveram seus estilos próprios, muito peculiares. Mia Couto assume a influência de Guimarães Rosa, assim como Guimarães Rosa assumiu a influência de James Joyce. Embora seja possível traçar semelhanças estéticas, cada um tem sua particularidade. São autores distintos, contextos históricos distintos, temas distintos, qualidades distintas.

O que o tal professor pretendia, de fato, era ressaltar sua alta qualificação literária como uma patente que lhe autoriza expressar o desdém - um discurso de autoridade. Pois, saiba ele, não conseguiu atingir o seu objetivo, uma vez que esse lugar ele deixou de ocupar no meu mais simples – mas não simplório – entendimento do que é literatura. Ele quis aproveitar a oportunidade e acabou por perder a patente que poderia ter conquistado...